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Despacho gratuito de bagagem: Gratuito?

por Eduardo Sanovicz

“Não existe almoço grátis”. “O único lugar onde se encontra queijo de graça é em uma ratoeira”.

As duas frases emblemáticas transcritas acima, a primeira popularizada pelo economista Milton Friedman e, a segunda, um provérbio russo, podem ilustrar texto e contexto em que o Senado Federal, em 17/05, aprova duas MPs que impactam o andamento da aviação comercial brasileira.

A MP 1.089/21, mais conhecida como a MP do Voo Simples, e a MP 1.094/21, sobre o Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF)
para o leasing de aeronaves. Enquanto a MP 1.089 vai retornar à Câmara para análise, a MP 1.094 vai para sanção do Presidente
da República.

Por um lado, a MP 1.089/21, a do Voo Simples, busca desburocratizar o ambiente de negócios do setor aéreo – o que é muito bem-vindo. No entanto, inclui a retomada do despacho gratuito de bagagem de até 23 quilos em voos nacionais e de até 30 quilos em voos internacionais.

O fato é que as motivações de ordem política, em ano eleitoral, soam como manobra de viés demagógico. E podem plantar, junto aos mais desavisados, a percepção falsa de que, sem pagar pelo despacho da bagagem, terá vantagem no preço do serviço aéreo, no seu todo.

Voltando ao mote inicial, pergunta-se: quem paga a conta? O presidente da ABEAR, Eduardo Sanovicz, profundo conhecedor do tema, observador arguto e ponderado nas análises que faz, sustenta que “as duas MPs são positivas para a aviação brasileira”. No entanto, não hesita em considerar que “o retorno da franquia obrigatória de despacho de bagagem é um erro. É um retrocesso que desalinha o país das melhores práticas internacionais para reduzir custos e, juntamente com a liberação ao capital estrangeiro, estimular a competitividade”.

Associa-se, muitas vezes, a não cobrança pelo despacho de bagagem nas viagens aéreas, ao chamado ‘efeito jabuticaba’ – fruta nativa que só se encontra no Brasil. Por analogia, essa medida com roupagem liberal vai de encontro às práticas correntes na grande maioria dos países.

Ora, se a cobrança pelo despacho da bagagem revela-se adequada mundo afora, funciona bem sob o aspecto de transparência e compliance, por que insistir numa espécie de reinvenção da roda?

Há outras questões em jogo
Mais uma vez, Eduardo Sanovicz é simples e didático. “Vale lembrar que não existe bagagem gratuita. Todos os passageiros vão ter de pagar essa conta. Era assim que funcionava anteriormente: o custo do despacho de bagagem era diluído em todos os bilhetes”.

O executivo acrescenta outros recortes que mostram o tamanho do problema que a aviação comercial brasileira enfrenta. Enfatiza que as empresas aéreas estão lidando, todos os dias, com a alta do preço do querosene de aviação (QAV), pressionada pelo aumento da cotação do barril de petróleo, por causa da guerra na Ucrânia. Além disso, também é preocupante a alta do dólar em relação ao real, pois 50% dos custos do setor são dolarizados.

No entendimento do presidente da ABEAR, a volta da franquia obrigatória do despacho de bagagem deverá afastar o interesse das empresas aéreas low cost de operar no país. Lembra que após a implantação da cobrança pela franquia de despacho de bagagens, em 2017, “ao menos oito empresas estrangeiras demonstraram interesse e começaram a operar no país. Em 2020, porém, a pandemia C-19 interrompeu esse movimento”.
Fatores externos Sobre o preço dos bilhetes, expectativa do setor, em 2017, era manter a queda no valor das tarifas que se verificava desde Porém, a alta do câmbio (60%) e do querosene (209%), de 2017 a maio de 2022, provocou uma verdadeira inversão deste movimento. E o aumento dos custos destes insumos acaba, sempre, repassado aos preços.

Cabe acrescentar que, no Brasil, o preço de uma passagem aérea recebe impacto forte de fatores externos. A começar pela cotação do dólar em relação ao real. Isso indexa mais da metade dos custos do setor, pressionando itens como o combustível dos aviões, manutenção e arrendamento de aeronaves.

Paradoxo Só o querosene de aviação representa, hoje, mais de 40% do custo de uma empresa aérea. E chega, também, a ser até 40% mais caro do que a média global. Não bastasse isso, o preço alto do barril de petróleo, pressionado pela guerra russo-ucraniana, é turbinado pela política de precificação da Petrobras.
A estatal cobra em dólares um insumo cujo nível de produção nacional é superior a 90%. “Em 2021, o país produziu 93% ou 4,1 bilhões do consumo total de 4,4 bilhões de metros cúbicos do querosene de aviação. E importou apenas 7%, segundo dados da ANP. Dessa maneira, não faz sentido a parcela produzida no Brasil ser precificada pelos mesmos critérios de petróleo importado”, conclui Eduardo Sanovicz.


Eduardo Sanovicz – presidente da ABEAR
(Entrevista concedida a Luiz Henrique Miranda, assessor de imprensa da ADVB)


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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da ADVB.

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